Deficiência de manganês na soja: Sintomas, causas e impactos

A soja (Glycine max), uma das principais culturas agrícolas do mundo, tem papel essencial na produção de óleo vegetal e como fonte de proteína para humanos e animais. No entanto, a produtividade da soja pode ser gravemente afetada por deficiências nutricionais, entre elas, a deficiência de manganês (Mn). O manganês é um micronutriente vital para as plantas, participando de vários processos fisiológicos e bioquímicos, que incluem desde a fotossíntese até a respiração celular. Quando há deficiência desse nutriente, os efeitos podem ser significativos, resultando em queda na qualidade e quantidade da produção.

O Papel do Manganês na Nutrição das Plantas

Modelo esquemático mostrando como a deficiência de manganês (Mn) afeta o crescimento e a fisiologia das plantas. Fonte: Lilay et al. (2024).
Modelo esquemático mostrando como a deficiência de manganês (Mn) afeta o crescimento e a fisiologia das plantas. Fonte: Lilay et al. (2024).

O manganês é um micronutriente necessário em pequenas quantidades, mas com um impacto significativo no crescimento e desenvolvimento das plantas. Ele desempenha funções críticas, como a ativação de enzimas, desintoxicação de espécies reativas de oxigênio (EROS), metabolismo de nitrogênio, participação no processo de fotossíntese e síntese de lignina.

1. Cofator Enzimático

O manganês atua como cofator em mais de 100 enzimas diferentes nas plantas, sendo crucial para a catálise de várias reações bioquímicas essenciais para a sobrevivência vegetal. Entre essas enzimas, a superóxido dismutase de manganês (Mn-SOD) é uma das mais importantes, ajudando a proteger as células vegetais dos danos causados por radicais livres. Sem níveis adequados de Mn, as plantas ficam mais suscetíveis ao estresse oxidativo, que pode comprometer sua saúde geral.

2. Fotossíntese

O manganês é vital para o processo de fotossíntese, especialmente no funcionamento do fotossistema II (PSII). Ele participa da fotólise da água, um processo que quebra as moléculas de água em oxigênio, prótons e elétrons, essencial para a produção de energia nas plantas. A deficiência de manganês compromete esse processo, reduzindo a eficiência fotossintética e, consequentemente, a produção de energia.

3. Síntese de Lignina

A lignina é um composto importante na estrutura celular das plantas, conferindo rigidez e resistência às paredes celulares. O manganês é necessário para a biossíntese de lignina, e sua deficiência pode resultar em uma menor lignificação das células. Isso torna as plantas mais suscetíveis a doenças e infecções, uma vez que tecidos mal formados são mais vulneráveis a patógenos.

4. Metabolismo de Nitrogênio

O manganês também está envolvido na assimilação de nitrogênio, que é fundamental para a síntese de aminoácidos e proteínas. Sem níveis adequados desse nutriente, as plantas têm dificuldades para converter nitrogênio em compostos úteis, prejudicando o crescimento e o desenvolvimento da soja.

5. Regulação da Respiração Celular

Outro papel importante do manganês é sua influência no ciclo de Krebs, um processo metabólico crucial na respiração celular. Sem o funcionamento adequado desse ciclo, a produção de energia nas plantas é prejudicada, afetando diretamente o crescimento da soja.

Sintomas da Deficiência de Manganês na Soja

Sintomas da Deficiência de Manganês na Soja

A deficiência de manganês se manifesta principalmente nas folhas mais jovens da planta, devido à sua baixa mobilidade no floema. Os sintomas mais visíveis incluem:

1. Clorose Internerval

A clorose internerval, caracterizada pelo amarelecimento das áreas entre as nervuras das folhas jovens, é o sintoma mais clássico da deficiência de manganês. As nervuras permanecem verdes, enquanto o tecido entre elas pode variar de verde-claro ao branco. Em casos mais severos, podem aparecer manchas marrons necróticas nas folhas.

2. Epinastia Foliar

Outro sintoma típico é a epinastia foliar, que é o dobramento das folhas na direção da base da planta. Esse fenômeno ocorre devido à redução da síntese de lignina nas células, enfraquecendo a estrutura das folhas e tornando-as incapazes de sustentar seu próprio peso.

3. Necrose Foliar

A necrose, ou morte dos tecidos das folhas, pode ocorrer em casos avançados de deficiência de manganês. As manchas necróticas costumam aparecer nas áreas já afetadas pela clorose, indicando que o problema está se agravando.

Esses sintomas podem ser facilmente confundidos com outras deficiências, como as de zinco ou ferro, ou até mesmo com a presença de nematoides no solo. Por isso, é crucial realizar um diagnóstico correto com o auxílio de uma análise foliar.

Causas da Deficiência de Manganês

Sintoma típico da deficiência de manganês em folhas novas e em lavoura com solo pobre em matéria orgânica. Foto de Mike Staton, MSU Extension.

A deficiência de manganês pode ser causada por uma série de fatores relacionados à composição e manejo do solo. Entre as principais causas estão:

1. pH Elevado do Solo

O pH do solo é um dos fatores mais críticos que afetam a disponibilidade de manganês para as plantas. Solos com pH acima de 6,2, especialmente aqueles que passaram por práticas de calagem, tendem a ter manganês em formas menos disponíveis, como Mn³⁺ e Mn⁴⁺. Apenas o Mn²⁺ é facilmente absorvido pelas plantas, e à medida que o pH aumenta, a quantidade de Mn disponível para a soja diminui drasticamente.

2. Solos Arenosos e Pobre em Matéria Orgânica

Solos arenosos são notoriamente pobres em nutrientes, inclusive manganês. Além disso, solos com pouca matéria orgânica não conseguem reter bem os nutrientes, o que leva à deficiência em micronutrientes como o manganês. Esses solos também são mais suscetíveis à oxidação do manganês disponível, o que agrava o problema.

3. Condições Climáticas Secas

Climas secos intensificam a deficiência de manganês. O solo bem oxigenado em climas secos promove a oxidação do Mn²⁺ para formas menos disponíveis. Além disso, a seca reduz a absorção de nutrientes pelas raízes, exacerbando os sintomas de deficiência.

4. Excesso de Cálcio, Magnésio e Ferro

A presença excessiva de outros nutrientes no solo, como cálcio (Ca), magnésio (Mg) e ferro (Fe), pode competir com o manganês pelos mesmos canais de absorção nas raízes das plantas, resultando em uma deficiência relativa de Mn, mesmo que sua concentração no solo esteja dentro de níveis aceitáveis.

Manganês e Glifosato: Mitos e Verdades

Existe uma crença amplamente difundida entre os agricultores de que o uso de glifosato em cultivares de soja resistentes ao herbicida (soja RR) causa deficiência de manganês. No entanto, essa teoria foi amplamente desmentida por estudos recentes. O fenômeno conhecido como yellow flashing (amarelecimento temporário das folhas) ocorre devido à toxicidade de um metabólito do glifosato, o AMPA, e não por uma interação direta com o manganês. Portanto, a aplicação de glifosato não é a responsável pela deficiência de Mn em cultivares RR.

Impactos da Deficiência de Manganês na Produção de Soja

Quando não corrigida, a deficiência de manganês pode ter impactos devastadores na produção de soja. A fotossíntese reduzida, a menor assimilação de nitrogênio e o crescimento radicular enfraquecido comprometem a saúde geral das plantas. A queda na produtividade varia conforme a severidade da deficiência, mas pode alcançar perdas significativas, especialmente em solos mais susceptíveis.

Além disso, plantas com deficiência de manganês são mais suscetíveis a infecções patogênicas, uma vez que a baixa lignificação das células torna os tecidos mais vulneráveis a doenças. Assim, o tratamento preventivo e corretivo do manganês é fundamental para manter a saúde e a produtividade da soja.

Manejo Nutricional: Prevenção e Correção da Deficiência

Para garantir o suprimento adequado de manganês, é importante seguir algumas práticas de manejo nutricional:

1. Análise de Solo e Foliar

O primeiro passo no manejo adequado é a realização de uma análise de solo para verificar os níveis de manganês disponíveis. A análise foliar também pode ser usada para confirmar a deficiência, especialmente se os sintomas forem visíveis nas plantas.

2. Calagem Moderada

Embora a calagem seja uma prática comum para corrigir a acidez do solo, ela deve ser realizada com moderação, pois pode elevar o pH a níveis que reduzem a disponibilidade de manganês. Em áreas onde a calagem é necessária, deve-se considerar a aplicação de fertilizantes ricos em Mn para compensar a redução da disponibilidade do nutriente.

3. Aplicação de Manganês no Solo

Quando o teor de manganês no solo estiver baixo, a adubação com fontes de oxi-sulfatos ou óxidos de manganês pode ser uma solução eficiente. Essa prática corrige a deficiência no solo, garantindo que o nutriente esteja disponível para as plantas ao longo do ciclo produtivo.

4. Aplicação Foliar de Manganês

A aplicação foliar é uma alternativa rápida e eficaz para corrigir deficiências de manganês em curto prazo. Fontes complexadas como Mn-EDTA têm sido usadas com sucesso para esse fim, já que possuem maior absorção pelas folhas e são menos propensas à precipitação. A aplicação pode ser feita junto com outros insumos agrícolas, como herbicidas, para reduzir custos operacionais.

Conclusão

A deficiência de manganês é um desafio comum nas lavouras de soja, especialmente em solos de alta acidez ou após práticas de calagem. No entanto, com um diagnóstico preciso e um manejo nutricional adequado, é possível evitar perdas significativas na produtividade. O monitoramento constante dos níveis de Mn no solo e nas plantas, juntamente com intervenções preventivas e corretivas, são as melhores estratégias para garantir uma colheita de sucesso.

Adotar essas práticas de manejo, baseadas em conhecimento científico e análise criteriosa, permite que o agricultor maximize a produção de soja, mantendo a saúde da lavoura e aumentando a eficiência econômica do cultivo.

Referências

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  • Um dos livros mais respeitados sobre nutrição mineral de plantas no Brasil, com uma seção dedicada ao manganês e sua importância para culturas como a soja.
  1. Marschner, H. (2012). Mineral Nutrition of Higher Plants. 3rd Edition. San Diego: Academic Press.
  • Um livro de referência global sobre nutrição mineral de plantas que aborda detalhadamente o papel do manganês e outros micronutrientes nas plantas.
  1. Epstein, E., & Bloom, A. J. (2005). Mineral Nutrition of Plants: Principles and Perspectives. 2nd Edition. Sunderland, MA: Sinauer Associates.
  • Este livro fornece uma compreensão aprofundada da nutrição de plantas, incluindo o papel dos micronutrientes como o manganês.
  1. Caires, E. F., & Fonseca, A. F. (2000). Efeitos da calagem na disponibilidade de manganês em solos ácidos sob plantio direto. Revista Brasileira de Ciência do Solo, 24(4), 905-915.
  • Este estudo brasileiro discute como a calagem afeta a disponibilidade de manganês em solos cultivados, uma questão central para o manejo da deficiência desse nutriente.
  1. Nogueira, T. A. R., et al. (2014). Impacto do glifosato e da deficiência de manganês no desenvolvimento da soja RR. Pesquisa Agropecuária Brasileira, 49(8), 600-608.
  • O artigo explora a relação entre o uso de glifosato e a deficiência de manganês, desmistificando a teoria de que o herbicida causa a deficiência.
  1. Moreira, A., & Moraes, L. A. C. (2007). Nutrição mineral de plantas com enfoque para soja. Embrapa Soja, Circular Técnica, 60.
  • Publicação técnica da Embrapa, que é uma excelente fonte de informações sobre a nutrição de soja e como lidar com deficiências de micronutrientes como o manganês.
  1. Marschner, P. (2011). Marschner’s Mineral Nutrition of Higher Plants. 3rd Edition. London: Academic Press.
  • Revisão abrangente sobre o papel dos nutrientes minerais nas plantas, com discussões detalhadas sobre deficiências de micronutrientes.
  1. Malavolta, E., Vitti, G. C., & Oliveira, S. A. (1997). Avaliação do Estado Nutricional das Plantas: Princípios e Aplicações. Piracicaba: Potafos.
  • Um guia prático para avaliação nutricional de plantas, ajudando a diagnosticar deficiências minerais como a de manganês.

Sobre o Autor

Rafael Consultor Agronomia
Rafael Consultor Agronomia

Especialista em Vants e Drones com foco em agricultura de precisão.

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